42091210229051065199.png O Axis Mundi: É possível ver um átomo?

É possível ver um átomo?

por Osvaldo Pessoa Jr.
No texto “Partículas e o Povo de Tlön” (clique aqui), mencionei que hoje em dia há microscópios que permitem observar átomos. Apresentei o que chamei de a primeira “foto” de um átomo, obtida em 1955. A estudante de química Larissa Ferreira protestou, pois falar em “foto” sugere que a imagem foi obtida por meio de luz visível focada com uma lente óptica. Aceitei sua objeção (não se deve brigar por causa da definição de uma palavra), e perguntei se ela aceitaria dizer que “observamos” o átomo.

Na verdade, podemos dizer que “vemos” átomos a todo momento, pois todas as coisas são feitas de átomos. Mas será que podemos ver um átomo individual? A resposta é sim, mesmo sem um instrumento. Em 1990, o físico Hans Dehmelt estudava um dispositivo chamado “armadilha magnética”, e conseguiu isolar um único íon de bário nessa armadilha (um íon é um átomo que tem elétrons a mais ou a menos, de forma que tem uma carga elétrica, o que é necessário para permanecer na armadilha). Ele até deu um nome ao íon, Astrid, e tirou uma foto! Para fazer isso. iluminou Astrid com uma luz azul, e ela absorvia a luz e rapidamente a emitia, de forma que se via um pontinho azul no meio da aparelhagem.
A figura ao lado é um fotoshop da imagem publicada por Dehmelt, que por sinal ganhou um Prêmio Nobel por suas armadilhas.
Podemos dizer que este ponto azul corresponde a milhões de fótons emitidos pelo átomo em um segundo, por isso ele é visível.

Mas será que podemos observar um átomo mais de perto, ver o ambiente nanoscópico que o cerca? Como mencionado acima, hoje em dia há dezenas de tipos diferentes de microscópios que são sensíveis a detalhes atômicos. Vejamos uma imagem obtida por um deles, na IBM (disponibilizada pela Almaden Research Center, Califórnia):
O “curral” consiste de 48 átomos de ferro adsorvidos numa superfície de cobre. Cada átomo de ferro aparece de forma pontiaguda, o que é um efeito de como a ponta do microscópio interage com os átomos. As cores são “falsas”. Dentro do curral, vemos ondas estacionárias formadas pelos elétrons da superfície do cobre. Esta imagem exibe de maneira notável o caráter ondulatório dos elétrons. O curral redondinho foi fabricado por meio de técnicas da nanotecnologia. Notamos na imagem duas “ilhotas” do lado de fora do curral, que são defeitos da superfície do cobre.

Em que sentido isso é uma “observação” de um sistema de átomos? Para examinar essa questão, analisemos algumas imagens mais usuais:

A foto embaixo, à esquerda, é do filósofo norte-americano Daniel Dennett. Ela se aproxima muito da maneira pela qual veríamos Dennett, se estivéssemos diante dele no dia em que a foto foi tirada. Podemos considerar esta imagem como sendo análoga a uma observação. Já a imagem em cima, à esquerda, é da filósofa Hipatia, de Alexandria. A pessoa que a desenhou não conheceu Hipatia, assim podemos considerar que esta imagem não é oriunda de observação, mas é uma representação fictícia, que procura representar algumas considerações teóricas que temos a respeito de Hipatia. Em cima, à direita, temos uma fotografia em preto e branco do filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard. Esta imagem é análoga a uma observação, só que ela não tem cores. E a imagem embaixo, à direita? É uma foto obtida com uma câmera sensível ao infravermelho: regiões quentíssimas aparecem em branco, regiões quentes em vermelho, e regiões mais frias em azul.

Pergunta: esta imagem está mais próxima de uma observação ou de uma representação fictícia? Eu diria que de uma observação. Mas e as cores falsas, elas não são fictícias? Sim, mas as cores “reais” que observamos também são uma criação de nossa mente, elas não existem “lá fora”, no mundo!

Voltemos agora à imagem do curral quântico: há cores falsas e há distorções de forma, mas ela captura a posição real dos átomos, e exibe defeitos que estavam realmente lá. É possível que tenha havido tratamento da imagem, para suavizá-la e retirar eventuais ruídos advindos das imperfeições do microscópio. Mas afora esse tratamento, eu diria que se trata de uma observação de átomos, mediada por instrumentos.

Vale a pena mostrar uma imagem da ponta de um microscópio usado nesses processos de medição (as cores são falsas, como sempre; obtido do site http://www.nanowerk.com/spotlight/id1456_2.jpg):

A pontinha minúscula é sensível à presença de átomos individuais. A detecção pode ocorrer devido à passagem de elétrons para a ponta (microscópio de tunelamento) ou devido a um deslocamento da ponta por causa da atração entre a ponta e um átomo (microscópio de força atômica).

Será possível observar o interior de um átomo? Um grupo de químicos (Zuo et al., 1999) obteve a seguinte imagem para os estados dos elétrons no interior de um átomo de cobre:

A figura da direita é a que aparece em livros didáticos de química, para representar um estado do elétron no átomo de hidrogênio. Esse estado é conhecido como “orbital 3dx2”. A imagem do meio (fonte: Arizona State University, Tempe) exprime a densidade de elétrons em torno de um átomo de cobre, onde o azul representa uma densidade menor do que a usual, e o vermelho uma densidade maior. A imagem da esquerda representa os átomos de cobre em um cristal de cuprita (Cu2O).

As imagens da densidade eletrônica são reconstruções em 3-dimensões dos dados obtidos pelos autores, combinando difração de raios X e de um feixe convergente de elétrons. Novamente, temos uma combinação de observação e reconstrução baseada em considerações teóricas. A semelhança entre tais imagens e as figuras de orbitais (como o desenho da direita) gerou bastante debate entre os pesquisadores em ensino de química, mas não entraremos aqui nessa controvérsia.

Em suma, parece que é possível “observar” átomos, com a mediação de instrumentos e incorporando suposições teóricas no tratamento dos dados. Espero que Larissa concorde com isso!

http://www2.uol.com.br/vyaestelar/fisicaquantica_atomo.htm

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